A primeira letra do alfabeto é também a primeira letra da palavra amor e se acha importantíssima por isso! Com A se escreve "arrependimento" que é uma inútil vontade de pedir ao tempo para voltar atrás e com A se dá o tipo de tchau mais triste que existe: "adeus"... Ah, é com A que se faz"abracadabra", palavra que se diz capaz de transformar sapo em príncipe e vice-versa...Com B se diz "belo" - que é tudo que faz os olhos pensarem ser coração; e se dá a "bênção", um sim que pretende dar sorte. Com C,
"calendário", que é onde moram os dias e o "carnaval", esta
oportunidade praticamente obrigatória de ser feliz com data marcada.
"Civilizado" é quem já aprendeu a cantar ´parabéns pravocê` e sabe o que
é "contrato": "você isso, eu aquilo, com assinatura embaixo". Com D , se chega à "dedução", o caminho entre o "se" e o"então"... Com D
começa "defeito", que é cada pedacinho que falta para se chegar à
perfeição e se pede "desculpa", uma palavra que pretende ser beijo. E
tem o E de
"efêmero", quando o eterno passa logo; de"escuridão", que é o resto da
noite, se alguém recortar as estrelas; e "emoção", um tango que ainda
não foi feito. E tem também "eba!", uma forma de agradecimento muito
utilizada por quem ganhou um pirulito, por exemplo...F
é para "fantasia", qualquer tipo de "já pensou se fosse assim?";
"fábula", uma história que poderia ter acontecido de verdade, se a
verdade fosse um pouco mais maluca; e "fé", que é toda certeza que
dispensa provas. A sétima letra do alfabeto é G, que fica irritadíssima quando aconfundem com o J. G, de "grade", que serve para prender todo mundo - uns dentro, outros fora; G de "goleiro", alguém em quem se pode botar a culpa do gol; G de "gente": carne, osso, alma e sentimento, tudo isso ao mesmo tempo. Depois vem o H
de "história": quando todas as palavras do dicionário ficam à
disposição de quem quiser contar qualquer coisa que tenha acontecido ou
sido inventada. O I de "idade", aquilo que você tem certeza que vai ganhar de aniversário, queira ou não queira. J
de "janela!, por onde entra tudo que é lá fora e de "jasmim", que tem a
sorte de ser flor e ainda tem a graça de se chamar assim. L
de "lá", onde a gente fica pensando se está melhor ou pior do que aqui;
de "lágrima", sumo que sai pelos olhos quando se espreme o coração, e
de "loucura", coisa que quem não tem só pode ser completamente louco. M de "madrugada", quando vivem os sonhos...N de "noiva", moça que geralmente usa branco por fora e vermelho por dentro. O de "óbvio", não precisa explicar...P de "pecado", algo que os homens inventaram e então inventaram que foi Deus que inventou. Q, tudo que tem um não sei quê de não sei quê. E R, de "rebolar", o que se tem que fazer pra chegar lá. S
é de "sagrado", tudo o que combina com uma cantata de Bach;
de"segredo", aquilo que você está louco pra contar; de "sexo": quando o
beijo é maior que a boca. T
é de "talvez", resposta melhor que ´não`, uma vez que ainda deixa, meio
bamba, uma esperança... de "tanto", um muito que até ficou tonto... de
"testemunha": quem por sorte ou por azar, não estava em outro lugar. U
de "ui", um ài" que ainda é arrepio; de "último", que anunciao começo
de outra coisa; e de "único": tudo que, pela facilidade de virar nenhum,
pede cuidado. Vem o V,
de "vazio", um termo injusto com a palavra nada; de "volúvel", uma
pessoa que ora quer o que quer, ora quer o que querem que ela queira. E
chegamos ao X, uma incógnita... X
de "xingamento", que é uma palavra ou frase destinada a acabar com a
alegria de alguém; e de "xô", única palavra do dicionário das aves
traduzida para o português. Z é a última letra do alfabeto, que alcançou a glória quando foi usada pelo Zorro... Z
de "zaga", algo que serve para o goleiro não se sentir o único culpado;
de "zebra", quando você esperava liso e veio listrado; e de "zíper",
fecho que precisa de um bom motivo pra ser aberto; e de "zureta", que é
como fica a cabeça da gente ao final de um dicionário inteiro.
Adriana Falcão - do livro Pequeno Dicionário de Palavras ao Vento.